segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

A Arte da Comunicação e as Redes Sociais

A comunicação verbal humana é um fenômeno complexo. Envolve no mínimo
dois sujeitos, sendo que um é o “emissor” (aquele que fala) e o outro é o
“receptor” (aquele que ouve), em papéis que se alternam ao longo da
comunicação. Fala-se na “arte” da comunicação, pois a comunicação em
processo é um fenômeno único e não replicável, que se compõe de vários subprocessos,
quais sejam: formular idéias, transformá-las em palavras, emiti-las,
enquanto que o ouvinte interpreta a fala do primeiro, formula, por sua vez, suas
idéias, transforma-as em palavras, emite-as, e é interpretado pelo primeiro, em
uma sequencia que propicia vários espaços para “ruídos” na comunicação. Em
resumo, nenhum dos envolvidos na comunicação expressa-se com
imparcialidade e escuta com imparcialidade. Ou seja, processamos informação
através de idéias, opiniões, crenças, aprendizados, etc., que desenvolvemos
ao longo de nossa existência. A interpretação, portanto e por princípio, envolve
a opinião daquele que interpreta.
As opiniões de uma pessoa não somente podem estar emocionalmente
ativadas, como também o sujeito, ao emitir sua opinião, possivelmente espera
do interlocutor não apenas o entendimento, a compreensão. Mas pode esperar
também o reconhecimento de sua opinião, que, muitas vezes, ele considera
“correta”, o reconhecimento de sua capacidade de formular opiniões, o
reconhecimento de que sua fonte de informações é confiável, ou até mesmo o
reconhecimento de sua “inteligência”, de sua capacidade de bem formular
opiniões. Por esses e outros motivos, muitas vezes, ao emitir uma idéia ou
opinião, o sujeito espera que esta seja “aceita” e reconhecida como “correta”, e
não apenas ouvida.
Essas idéias explicariam não somente porque alguns têm dificuldade em
aceitar uma opinião contrária, mas também as interferências nas
comunicações, decorrentes das interpretações dos sujeitos envolvidos: um que
fatalmente não ouve o que o outro “expressa”, mas interpreta o que o outro diz
à luz de sua história, ou seja, “ouve” o que quer, enquanto que, ao formular sua
própria opinião, está sujeito à mesma subjetividade, também expressando e
“ouvindo” o que quer.
Reconhecer a complexidade do fenômeno “comunicação”, reconhecer que ao
“ouvir”, na realidade, interpretamos, e respeitar o fato de que o outro, com base
em sua história, que é diferente da sua, pode ter uma opinião diametralmente
oposta a respeito do mesmo objeto, resultaria na tolerância que gostaríamos de
ver em todos os sujeitos envolvidos no processo de comunicar-se com outros.
Acrescente-se a isso o papel das emoções geradas, que, muitas vezes,
representam mais um fator de interferência na “escuta” do outro e na
formulação das próprias idéias, e teremos um processo com potencial
explosivo e que pode remeter a conflitos.
Quando estamos envolvidos emocionalmente com nossas opiniões, gostamos
de partilhá-las, e especialmente, gostamos de partilhá-las com quem tem
opiniões consistentes com as nossas. Mas é interessante estarmos alertas ao
fato de que o outro pode partilhar apenas de parte de nossas idéias; ou o outro,
ao contrário do que inicialmente parecia, pode, na realidade, não partilhar de
quase nada das nossas idéias. Nesse caso, entram em jogo o reconhecimento
dos possíveis “ruídos” na comunicação, referidos acima, o reconhecimento das
diferentes histórias de vida daqueles envolvidos em partilhar opiniões, etc., a
fim de que uma possibilidade de conflito e de choque de opiniões possa
representar, ao contrário, uma boa oportunidade de aprendizado, de exposição
a algo diferente, a algo novo.
Emitir sua opinião nas redes sociais e esperar que sejam aceitas e
reconhecidas como “corretas” pode, na realidade, refletir não o desejo de
reconhecimento de sua(s) opinião(ões), mas o desejo de ser reconhecido como
pessoa competente, que tem idéias brilhantes e originais a respeito de
assuntos diversos. Ou seja, pode refletir não o desejo de comunicar-se, mas a
necessidade de se auto-afirmar, de fortalecer seu auto-conceito, que pode não
ser muito positivo até aquele momento. Isso explicaria parte dos debates
acirrados que vemos nas redes sociais, neste momento crítico que vive a
sociedade brasileira. A agressão entraria como uma estratégia para intimidar o
outro “receptor”, o que ouve, que discorda da opinião do primeiro, o “emissor”,
aquele que fala, em uma tentativa, pelo emissor, de alinhar o receptor à sua
opinião, de força-lo a aceitar suas idéias, o que apenas gera tensão e interfere
com a comunicação! Quando os envolvidos na comunicação não reconhecem
o processo de formulação de idéias próprias e o direito de emiti-las, tem-se
conflitos, inclusive entre amigos, em cujo caso a tensão pode até propiciar o
rompimento de vínculos afetivos e de amizade. Uma possível solução é evitar
conversas sobre temas polêmicos, até que os ânimos se acalmem.

Ana Maria Serra
PhD Psicologia - Terapeuta Cognitivo-Comportamental
Especialista em Psicologia Clínica
Diretora Clínica e Pedagógica
ITC - Instituto de Terapia Cognitiva
Av. das Nações Unidas, 8501 - 17o. andar
CEP 05425-070 São Paulo, SP
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